O
ensinamento do Magistério ordinário
e universal da Igreja sobre a legitimidade do direto
de propriedade |
A Igreja determina que o direito de propriedade
permaneça intacto e inviolável para cada
um.
Encíclica
Quod Apostolici Muneris de 28 de dezembro de 1878:
“Os
sectários do socialismo, apresentando o direito
de propriedade como uma invenção humana
que repugna à igualdade natural dos homens, e reclamando
o comunismo dos bens, declaram que é impossível
suportar com paciência a pobreza e que as propriedades
e regalias dos ricos podem ser violadas impunemente. Mas
a Igreja, que reconhece muito mais útil e sabiamente
que existe a desigualdade entre os homens, naturalmente
diferentes nas forças do corpo e do espírito,
e que esta desigualdade também existe na propriedade
dos bens, determina que o direito de propriedade ou domínio,
que vem da própria natureza, fique intacto e inviolável
para cada um”.
[Documentos
Pontifícios, Vozes, Petrópolis, fasc. 17,
4a ed., 1962, p. 12]
O direito do trabalhador ao salário
dá origem à propriedade privada.
Encíclica
Rerum Novarum de 15 de maio de 1891:
“Os
socialistas, para curar este mal, instigam nos pobres
o ódio invejoso contra os que possuem, e pretendem
que toda a propriedade de bens particulares deve ser suprimida,
que os bens dum indivíduo qualquer devem ser comuns
a todos, e que a sua administração deve
voltar para os Municípios ou para o Estado. Mediante
esta transladação das riquezas e das comodidades
que elas proporcionam entre os cidadãos, lisonjeiam-se
de aplicar um remédio eficaz aos males presentes.
Mas
semelhante teoria, longe de ser capaz de pôr termo
ao conflito, prejudicaria o operário se fosse posta
em prática. Outrossim, é sumamente injusta,
por violar os direitos legítimos dos proprietários,
viciar as funções do Estado e tender para
a subversão completa do edifício social.
De
fato, como é fácil compreender, a razão
intrínseca do trabalho empreendido por quem exerce
uma arte lucrativa, o fim imediato visado pelo trabalhador,
é conquistar um bem que possuirá como próprio
e como pertencendo-lhe; porque, se põe à
disposição de outrem suas forças
e sua indústria, não é, evidentemente,
por outro motivo senão para conseguir com que possa
prover à sua sustentação e às
necessidades da vida, e espera do seu trabalho, não
só o direto ao salário, mas ainda um direito
estrito e rigoroso para usar dele como entender. Portanto,
se, reduzindo as suas despesas, chegou a fazer algumas
economias, e se, para assegurar a sua conservação,
as emprega, por exemplo, num campo, torna-se evidente
que esse campo não é outra coisa senão
o salário transformado: o terreno assim adquirido
será propriedade do artista com o mesmo título
que a remuneração do seu trabalho. Mas quem
não vê que é precisamente nisso que
consiste o direito de propriedade mobiliária e
imobiliária? Assim, esta conversão da propriedade
particular em propriedade coletiva, tão preconizada
pelo socialismo, não teria outro efeito senão
tornar a situação dos operários mais
precária, retirando-lhes a livre disposição
do seu salário e roubando-lhes, por isso mesmo,
toda a esperança e toda a possibilidade de engrandecerem
o seu patrimônio e melhorarem a sua situação”.
[Documentos
Pontifícios, Vozes, Petrópolis, fasc. 2,
6a ed., 1961, pp. 5-6]
Deus desejou que os homens dominassem
os bens da terra por meio do regime de propriedade privada.
Encíclica
Rerum Novarum de 15 de maio de 1891:
“Não
se oponha também à legitimidade da propriedade
particular o fato de que Deus concedeu a terra a todo
o gênero humano para a gozar, porque Deus não
a concedeu aos homens para que a dominassem confusamente
todos juntos. Tal não é o sentido dessa
verdade. Ela significa, unicamente, que Deus não
assinou uma parte a nenhum homem em particular, mas quis
deixar a limitação das propriedades à
indústria humana e às instituições
dos povos. Aliás, posto que dividida em propriedades
particulares, a terra não deixa de servir à
utilidade comum de todos, atendendo a que ninguém
há entre os mortais que não se alimente
do produto dos campos. Quem os não tem, supre-os
pelo trabalho, de maneira que se pode afirmar, com toda
a verdade, que o trabalho é o meio universal de
prover às necessidades da vida, quer ele se exerça
num terreno próprio, quer em alguma arte lucrativa
cuja remuneração, apenas, sai dos produtos
múltiplos da terra, com os quais se ela comuta”.
[Documentos
Pontifícios, Vozes, Petrópolis, fasc. 2,
6a ed., 1961, p. 7]
Igualdade na miséria: conseqüência
da abolição da propriedade privada.
Encíclica
Rerum Novarum de 15 de maio de 1891:
“Substituindo
a providência paterna pela providência do
Estado, os socialistas vão contra a justiça
natural e quebram os laços da família. Mas,
além da injustiça do seu sistema, vêem-se
bem todas as suas funestas conseqüências, a
perturbação em todas as classes da sociedade,
uma odiosa e insuportável servidão para
todos os cidadãos, porta aberta a todas as invejas,
a todos os descontentamentos, a todas as discórdias;
o talento e a habilidade privados dos seus estímulos,
e, como conseqüência necessária, as
riquezas estancadas na sua fonte; enfim, em lugar dessa
igualdade tão sonhada, a igualdade na nudez, na
indigência e na miséria.
Por
tudo o que Nós acabamos de dizer, se compreende
que a teoria socialista da propriedade coletiva deve absolutamente
repudiar-se como prejudicial àqueles mesmos a que
se quer socorrer, contrária aos direitos naturais
dos indivíduos, como desnaturando as funções
do Estado e perturbando a tranqüilidade pública.
Fique, pois, bem assente que o primeiro fundamento a estabelecer
para todos aqueles que querem sinceramente o bem do povo,
é a inviolabilidade da propriedade particular”.
[Documentos
Pontifícios, Vozes, Petrópolis, fasc. 2,
6a ed., 1961, pp. 10-11]
O
exercício do direito de propriedade é não
só permitido, mas absolutamente necessário.
Encíclica
Rerum Novarum de 15 de maio de 1891:
“A
propriedade particular, já Nós o dissemos
mais acima, é de direito natural para o homem:
o exercício deste direito é coisa não
só permitida, sobretudo a quem vive em sociedade,
mas ainda absolutamente necessária (Santo Tomás,
II-II, q. 66, a. 2)”
[Documentos
Pontifícios, Vozes, Petrópolis, fasc. 2,
6a ed., 1961, p. 16]
A atenuação do regime de
propriedade privada leva rapidamente ao coletivismo.
Encíclica
Quadragésimo Anno de 15 de maio de 1931:
“Deve,
portanto, evitar-se cuidadosamente um duplo erro, em que
se pode cair. Pois, como negar ou cercear o direito de
propriedade social e pública precipita no chamado
‘individualismo’ ou dele muito aproxima, assim,
também, rejeitar ou atenuar o direito de propriedade
privada ou individual leva rapidamente ao ‘coletivismo’
ou pelo menos à necessidade de admitir-lhe os princípios”.
[Documentos
Pontifícios, Vozes, Petrópolis, fasc. 3,
5a ed., 1959, p. 19]
O
direito de propriedade é distinto de seu uso.
Encíclica
Quadragésimo Anno de 15 de maio de 1931:
“A
fim de pôr termo às controvérsias
que acerca do domínio e deveres a ele inerentes
começam a agitar-se, note-se em primeiro lugar
o fundamento assente por Leão XIII, de que o direito
de propriedade é distinto do seu uso (Encíclica
Rerum Novarum, § 35). Com efeito, a chamada justiça
comutativa obriga a conservar inviolável a divisão
dos bens e a não invadir o direito alheio, excedendo
os limites do próprio domínio; mas que os
proprietários não usem do que é seu,
senão honestamente, é da alçada não
da justiça, mas de outras virtudes, cujo cumprimento
‘não pode urgir-se por vias jurídicas’
(cfr. Encíclica Rerum Novarum, § 36)”.
[Documentos Pontifícios, Vozes, Petrópolis,
fasc. 3, 5a ed., 1959, p. 19]
O direito de propriedade não se
perde pelo abuso
Encíclica Quadragésimo Anno de 15 de maio
de 1931:
"Sem razão afirmam alguns que o domínio
e o seu uso são uma e a mesma coisa; e muito mais
ainda é alheio à verdade dizer que se extingue
ou se perde o direito de propriedade com o não
uso ou abuso dele".
[Documentos Pontifícios, Vozes, Petrópolis,
fasc. 3, 5a ed., 1959, p. 19]
A propriedade privada é
essencial ao bem comum.
Encíclica
Quadragésimo Anno de 15 de maio de 1931:
“A
própria natureza exige a repartição
dos bens em domínios particulares, precisamente
a fim de poderem as coisas criadas servir ao bem comum
de modo ordenado e constante. Este princípio deve
ter continuamente diante dos olhos quem não quer
desviar-se da reta senda da verdade”.
[Documentos
Pontifícios, Vozes, Petrópolis, fasc. 3,
5a ed., 1959, p. 24]
A propriedade pessoal assegura
a liberdade do homem.
Radiomensagem
de Natal de 1956:
“A
segurança! A aspiração mais viva
dos homens de hoje! Eles a pedem à sociedade e
às suas leis. Mas os pretensos realistas deste
século demonstraram que não estavam em condições
de proporcioná-la, precisamente porque querem substituir-se
ao Criador e fazer-se árbitros da ordem da criação.
A
Religião, e a realidade do passado, ensinam, pelo
contrário, que as estruturas sociais, como o casamento
e a família, a comunidade e as corporações
profissionais, a união social na propriedade pessoal,
são células essenciais que asseguram a liberdade
do homem, e... com isto, seu papel na história.
Elas são, pois, intangíveis e sua substância
não pode ser submetida a revisão arbitrária”.
[Discorsi
e Radiomessaggi di Sua Santità Pio XII, vol. XVIII,
p. 734].
A
verdadeira liberdade encontra no direito de propriedade
garantia e incentivo.
Encíclica
Mater et Magistra de 15 de maio de 1961:
“Tais
condições da vida econômica sem dúvida
são uma das causas por que se espalha a dúvida
sobre se, na atuais circunstâncias, perdeu sua força
ou se tornou de menor valor o princípio da ordem
econômico-social firmemente ensinado e defendido
por Nossos Predecessores: o princípio que declara
ser um direito natural dos homens o de possuir individualmente
até mesmo bens de produção.
Esta
dúvida é totalmente infundada. Com efeito,
o direito da propriedade privada, mesmo em relação
a bens empregados na produção, vale para
todos os tempos. Pois depende da própria natureza
das coisas, que nos diz ser o indivíduo anterior
à sociedade civil e, por este motivo, ter a sociedade
civil por finalidade o homem. De resto, a nenhum indivíduo
se reconheceria o direito de agir livremente em matéria
econômica se não lhe fosse igualmente concedida
a faculdade de escolher e de empregar os meios necessários
ao exercício deste direito. Além disto,
a experiência e a História atestam que, onde
os regimes políticos não reconhecem aos
particulares a posse mesmo de bens de produção,
aí é violado ou completamente destruído
o uso da liberdade humana em questões fundamentais.
De onde se patenteia, certamente, que a liberdade encontra
no direito de propriedade proteção e incentivo.
Aí
se deve procurar o motivo por que certos partidos e movimentos
políticos e sociais que procuram harmonizar a liberdade
e a justiça na sociedade humana, e que até
bem pouco não aceitavam o direito da propriedade
particular sobre bens produtores de riquezas, esses mesmos,
hoje, mais esclarecidos pelo curso das questões
sociais, reformam sua opinião e aprovam este mesmo
direito.
Apraz-Nos,
portanto, citar as palavras de Nosso Predecessor Pio XII,
de feliz memória:'A Igreja, protegendo o direito
da propriedade particular, tem em vista um excelente fim
ético-social. De nenhum modo pretende Ela defender
a atual ordem de coisas com se nela reconhecesse a expressão
da vontade divina, nem assume o patrocínio dos
opulentos e plutocratas, desprezando os direitos dos pobres
e indigentes... A verdadeira intenção da
Igreja consiste em fazer com que o instituto da propriedade
particular seja tal como o desígnio da Divina Sabedoria
e a lei natural o estabeleceram’ (Radiomensagem
de 1o de setembro de 1944; cfr. A.A.S. XXXVI, 1944, p.
253). Isto é, cumpre que a propriedade particular
seja uma garantia da liberdade da pessoa humana e ao mesmo
temo intervenha como elemento indispensável no
estabelecimento de uma reta ordem social.
Enquanto,
como já dissemos, em muitos países as recentes
condições econômicas têm-se
desenvolvido rapidamente, tornando a produção
mais eficiente, a justiça e a equidade exigem que
igualmente seja aumentado o salário do trabalho,
sem prejuízo para o bem comum. Isto permitirá
ao trabalhador fazer economias com mais facilidade e assim
conseguir um pequeno pecúlio. É, pois, de
admirar que seja contestado por alguns o caráter
natural do direito de propriedade, deste direito que haure
sempre na fecundidade do trabalho sua força e seu
vigor; que contribui de modo tão eficaz para a
proteção da dignidade da pessoa humana,
e para o livre desempenho dos deveres de cada um em todos
os campos de atividade; que, finalmente, fortalece a união
e tranqüilidade do lar e traz um aumento de paz e
prosperidade ao Estado.
Contudo,
não basta afirmar o caráter natural do direito
da propriedade particular, inclusive de bens produtivos,
se ao mesmo tempo não se emprega todo o esforço
para que o uso desse direito seja difundido entre todas
as classes de cidadãos”.
[“Catolicismo”,
nº 129, setembro de 1961, p. 4]